quarta-feira, 29 de julho de 2009

Cidadão Quem

As pessoas parecem não perceber, mas por trás dos óculos nerds, da barba de pseudo-intelectual, do all star, dos jeans, dos discos e dos filmes alternativos, existe um Fagner que gosta das coisas boas, simples, populares e - porque não dizer - bregas da vida. Um domingo na praia regado a cerveja em lata, uma comédia romântica debaixo dos cobertores com a namorada, uma noitada de pagode, um chimarrão bem quentinho numa manhã fria (ou quente, hehehe) são coisas que, embora em um primeiro momento não pareçam, combinam perfeitamente com minha pessoa.

Como o Cidadão Quem...

Conheci a banda há uns 12 anos, acho. Não sei exatamente o ano, só que ainda morava em Caxias (saí de lá em 1999). Por algum raio de motivo que ignoro, um CD deles apareceu nas minhas mãos: Spermatozoom. Meu primeiro pensamento foi "por que infernos alguém colocaria esse nome no disco?". Claro que ele foi para o limbo dos CDs.

Até o dia em que, escutando rádio, ouvi uma música cafoníssima que me agradou em cheio os ouvidos. Chamava-se "Dia Especial" e, tãdãn, advinha quem tocava? Então... catei o disco, coloquei-o no player e para surpresa, pelo menos meia dezenas de música eram bem legais. Bregas, mas legais! Instrumentos acústicos estavam sempre em primeiro plano. A voz era firme, mas suave. As letras tratavam de temas tão absurdamente corriqueiros e - mais uma vez - cafonas, que podiam ser ouvidas milhares e milhares de vezes sem enjoar. Falavam de amizade, de praia, de casais felizes e sorridentes, de todas aquelas coisas utópicas que só as letras de músicas são capazes de proporcionar.

Confesso que achei o nome do disco ainda mais estranho, mas desisti desencanar e me ater nas músicas. Passava por uma fase meio complicada: minha avó estava com câncer, tinha perspectiva de deixar a cidade de onde nasci e meter-me num lugar provinciano chamado Montenegro, enfim, aquela fase aborrecente que eu - graças a deus - ainda não saí. hahahahaha.

Cidadão Quem se tornou, então, um dos meus grupos gaúchos favoritos, ao lado da Graforréia, dos Engenheiros, do Nenhum de Nós (e mais tarde, da Superguidis, Tom Bloch e uma dúzia de bandas alternativas que dão a impressão que eu só curto o underground). O tempo passou e eu dificilmente paro para escutá-los, mas as vezes o disco volta para o player ou o YouTube dá uma mão em algum vídeo que me traz sensações nostálgicas.

Ao Fim de Tudo

Um dia

Dia Especial

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Boa notícia!

Já está rolando pela net a estréia solo de Paul Banks. Mesmo usando um pseudônimo de bixa - Julian Plenti -, o disco é muito massa. O mais interessante é que embora existam grandes semelhanças entre o trabalho da banda e o som solo do cara (a voz cavernosa, o clima sombrio, por exemplo), percebe-se claramente que o trabalho feito por Plenti não se encaixaria na banda de Banks.

Buenas, pra quem não sabe - e não reconhecer pela música -, Julian Plenti (e, principalmente, Paul Banks) é o cara que coloca a voz nas músicas do Interpol. Então, mesmo que não empolgue, é certeza de coisa boa!

Julien Plenti - Fun That We Have
Nem vou falar nada sobre esse visualzinho 'Plenti'. hahahahaha

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Ceratocone


Sofro de um problema oftalmológico bastante incômodo: o ceratocone. Consiste, basicamente, no afinamento da região central da córnea, fazendo com que ela se deforme e ganhe um aspecto parecido com um cone. O problema, obviamente, afeta a visão em maior ou menor grau e, dependendo do avanço da doença (se é que pode-se usar este termo), existem formas de tratamento: desde a utilização de lentes de contato rígidas de gás-permeável até o transplante de córnea.

Minha história com o ceratocone começou pouco antes da metade de 2008. Sempre tive problemas com meus olhos. Coceira, crises de conjuntivite e inchaços sem causa aparente eram frequentes. Aquilo me incomodava, mas não tanto quanto no dia em que comecei a sentir minha visão meio turva. No começo pensei que era algum tipo mais grave de conjuntivite, cuja secreção embaçava minha visão. Uma consulta na emergência de uma clínica especializada e lá estava eu - mais uma vez - com uma carga de colírios. Que tanto efeito quanto usar sacos de areia para aterrar o mar.

Continuei minhas consultas naquela clínica, com a mesma oftalmo. Fiz exames de fundo de olho, exames de contraste para verificar alguma anormalidade em alguma região profunda dos meus globos oculares, exames que me deixavam com as vistas tão cansadas que era necessário levar alguém comigo nas visitas a hospitais e clínicas e ser trazido de volta como um legítimo cego. Mesmo assim, não desisti daquela médica.... até o dia em que ela sugeriu que meu problema era PSICOLÓGICO. Eu não tinha nem um problema na visão e ela disse que, inclusive, minha visão parecia menos 'borrada' do que na consulta anterior.

Era o momento de cair fora. Mas eu não sabia mais para onde correr. Havia passado por, pelo menos uma dezena de especialistas nos últimos anos e meus olhos iam de mal a pior. Lembrei de dois irmãos que possuem consultório no bairro Bela Vista, zona nobre de Porto Alegre. Dois tipos muito esquisitos com os quais minha mãe se consultou por um bom tempo e eu tivera uma breve passagem. Marquei a consulta esperançoso, mais uma vez.

Chegando lá, fui prontamente atendido. Algo que eu percebi, com o passar do tempo, era que eles nunca se atrasavam. O irmão que me consultou diagnosticou um quadro grave de conjuntivite que precisava ser tratado imediatamente. Antes, no entanto, escutei uma coisa que achei engraçada e me fez pensar que o médico não estava falando comigo: que cone, hein? E, depois, como se estivesse falando para si mesmo, completou: tu tens um ceratocone em estágio bem avançado no olho direito, querido.

Disse aquilo com tanta naturalidade como se imaginasse que eu tivesse a perfeita idéia de ter uma coisa daquelas. Obviamente eu, com um diagnóstico anterior de cegueira psicológica (ei, Saramago, olha eu), não tinha a mínima idéia de que diabo era aquilo. Mas, como estava em um consultório médico, imaginei que não era algo como um novo tipo de sorvete em forma de cone e perguntei O QUE ERA UM CERATOCONE?

Depois de toda a explicação que está no começo do post - com acréscimo de detalhes que explicavam que minha visão de assemelharia a de uma pessoa que possuísse alto grau de astigmatismo e que a doença poderia progredir - ele me explicou que antes de começarmos a trabalhar no ceratocone, deveríamos tratar da conjuntivite. Saí de lá com uma preocupação a mais - a porra do cone; um alívio - de ter descoberto a causa do problema; e uma receita com mais coisinhas para pingar no olho.

O tratamento da conjuntivite durou cerca de seis meses, ao invés dos 15 dias inicialmente previstos. A bactéria era tão resistente que foi necessário utilizar um medicamento que não recordo o nome mas que é um antibiótico de reserva. Isto quer dizer que se aquilo não matasse a bactéria, nada mais mataria e eu teria uma companheira me enchendo o saco para o resto da minha vida.

Feito isto, partimos para o ceratocone. Primeiro, um exame chamado topografia, que apresenta um 'mapa' do relevo da córnea (o resultado também aparece em forma de dados). No exame do olho direito, o equipamento não conseguiu criar o tal 'mapa' pois o cone tinha dimensões que extrapolavam a 'cartografia' do negócio. Na época, a topografia serviria para verificar o 'tamanho' do meu cone e para a confecção das lentes de contato que eu deveria usar.

As lentes prometiam ser a salvação. Mas quando foram parar nos meus olhos, vi que tudo não passava de propaganda enganosa. Dois pedaços de vidro côncavos enfiados dentro do teu olho. Claro que a visão melhorou consideravelmente. Mas não a ponto de me fazer acreditar que eu conseguiria ficar com elas por muito tempo. Nunca queiram saber a sensação de uma pessoa quando existe um pedaço de vidro tentando perfurar o globo ocular dela.

Mas esse era só UM dos problemas. A coceira era insuportável o que fazia com que muitas vezes eu tirasse as lentes do lugar - e deu sabe onde elas iam parar. O pânico quando se desloca uma delas vem de duas formas. Pela dor, quando a lente cai em algum lugar MAIS sensível do olho e tu não sabe se não é melhor arrancar o olho fora. Ou pelo pavor de ter perdido uma daquelas merdas - que são caríssimas. Porque quando elas param em algum lugar que não dói, a pessoa não sabe se elas AINDA estão no olho ou se decidiram 'pular'. A situação é um pouco mais deplorável quando isso acontece em lugares como ônibus, trens, lojas e outros locais públicos.

Mesmo assim, acho que o pior de tudo diz respeito às secreções. Indivíduos com ceratocone normalmente - não sempre - sofrem de problemas alérgicos. O meu quadro alérgico era grave, segundo o oftalmo. Eu tinha CONJUNTIVITE ALÉRGICA. Já não me bastavam TODAS as conjuntivites que já experimentei, Agora era a vez da alérgica. E alergias, não sei se vocês sabem, não têm cura.

Bem, as secreções. Como pequenos bichinhos com garras, elas se fixavam nas lentes, embaçando a visão como se alguém tivesse dado baforadas nela. Além disso, me deixavam com a sensação de ter um problema eterno de remelas. Ainda tem um outro sintoma, que é o pior. Mas é algo tão ruim que não sei explicar.

Comecei o tratamento e, é claro, não estou conseguindo segui-lo. As lentes passam mais tempo nos estojos do que nos olhos e, quando saem, voltam rapidinho para o esconderijo. Sei que não sou uma pessoa muito tolerante a dor. Mas, realmente, não rola de ficar com elas.

Agora, meu olho esquerdo, que foi presenteado com um cone em estágio inicial, começa a dar sinais de avanço. E, embora eu tente passar uma imagem de que estou indo muito bem, de que ficar cego aos 26 anos faz parte da vida, eu estou - há meses - desesperado. Quando escolhi minha profissão - de jornalista -, aos 17 anos, o fiz apenas pelo imenso prazer de ler e escrever. E estas não me parecem atividades praticadas por cegos (já tenho, inclusive, dificuldades em ler algumas coisas ou em escrever, em determinados momentos). A perda da visão também transforma a pessoa em alguém atrapalhado, o que, no meu caso, poderia me tornar num perigo indescritível para a sociedade.

Mas, enfim, ontem procurei um outro médico, para tentar uma segunda opinião. Recebia a notícia de que as lentes eram realmente o tratamento correto mas foi reconfortante saber que eu não sou a única pessoa que não conseguiu se adaptar. Passarei por novos exames para que se tenha noção exata do estágio do meu problema. Mas o oftalmo garantiu que o olho direito é de transplante.

Isso era o que eu queria ouvir há muito tempo. Transplantes de córnea são os mais simples que existem: a taxa de rejeição é muito baixa, a recuperação é fácil, não é necessária internação. Além disso, o tempo na fila de espera é relativamente curto, em torno de um ano e meio.

Depois desta boa notícia fico realmente pensando se tenho o direito de estar chateado. Em um ano e meio eu deveria estar me formando na faculdade e concretizando o projeto que eu estou há anos trabalhando para que se realize: sair de casa e viajar. Morar no exterior.

Mesmo assim, gostaria que as coisas fossem mais simples. Mas, enfim, Ces't la vie.

Isto é só um desabafo, já que é complicado conversar isto com outras pessoas. Não há necessidade de se preocupar. Ainda assim, me sinto melhor que boa parte das pessoas que eu conheço. hahahahahaha

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Vincent - 1982

Um dos primeiros trabalhos de Tim Burton, a animação em stop-motion Vincent. Desde o começo da carreira, o cara já mostrava qual seria o perfil de suas obras.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

"ABRAM ALAS QUE MINHAS CRIANÇAS... TÊM AULA!"

Existem coisas que se não fossem trágicas seriam cômicas. E a Yeda deu provas, ontem, durante a manifestação dos professores em frente a sua casa, que não existem limites para o RIDÍCULO. De todos os momentos, fico com o mais DIVER: quando ela mostra um cartaz dizendo VOCÊS NÃO SÃO PROFESSORES. TORTURAM CRIANÇAS. ABRAM ALAS QUE MINHAS CRIANÇAS TÊM AULA!.

Eu JURO que me retorci de rir.

Quanto a parte sem graça - quando ela expôs netos ao ridículo e quase à humilhação pública - não vou me ater. Afinal, a filha também estava lá, o que prova que loucura é hereditária.

Também não vou, é claro, entrar em detalhes sobre quem estava certo ou errado. É um pouco envergonhante ver que as pessoas que deveriam cuidar da educação de crianças e jovens se prestam a atos sem sentido (uma manifestação deste porte no Piratini seria mais coerente, mesmo se levarmos em conta que a casa é parte de todo um esquema podre que está sendo investigado). Mas ver a governadora do Estado se prestar a esse fiasco é ABSURDO.

Pelo menos temos a desculpa de que ela é PAULISTA. hahahaaha

E, obviamente, não vou comentar NADA sobre o semblante zombeteiro e debochado da nossa ilustre governadora. NADA, MESMO!

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Post de Twitter no blog

Só tenho uma coisa a dizer: ESTOU CANSADO!!!! Mentira, tenho outra. Tou me dobrando de rir com a Yeda, hoje. Agora fui!

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Paradoxo (ou um texto que se perde no meio do caminho)

Embora eu passe por um dos momentos mais IMPRODUTIVOS da minha vida profissional, não me sinto preocupado com isso. É estranho, mas não é ruim. Como disse uma amiga esse final de semana, a vida é feita de fases. E a fase "vestir a camisa da empresa" acabou. Certamente um dia ela voltará, já passei por isso outras vezes. Mas tenho quase certeza que não mais será nessa empresa.
Ou talvez sim. Porque - apesar de todos os percalços, todos os entraves, todas as burocracias, todas as coisas que me desestimulam - quando penso nas pessoas que são próximas de mim no trabalho, que me dão apoio, que fazem com que tudo seja menos complicado, me reanimo e vejo que, pelo menos por esse ângulo, meu esforço vale a pena!
Por elas, só por elas! :D

quarta-feira, 8 de julho de 2009

A primeira e última vez

Existe um fator decisivo para que eu continue morando em Novo Hamburgo: um projeto maior que começou a tomar forma este mês e deverá se concretizar até o final de 2010. Um projeto de vida, eu diria, que me mantém na decadente Capital Nacional do Calçado.

No meio disto tudo, deparo-me com a figura Eduardo Galeano – jornalista e escritor uruguaio que, por aquelas injustiças que só o destino explica, nunca teve seu trabalho devidamente reconhecido. (Re)ler a obra de um de meus literários favoritos não costuma me trazer grandes recordações. Mas minha história relativa ao Galeano está relacionada àqueles acontecimentos que, de tão surreais, parecem cotidianos.

Era novembro de 2008. Havia anos que não segurava na mão uma obra do uruguaio. E não tinha a mínima pretensão de que acontecesse naquele dia. Puxando um pouco mais pela memória, era terça-feira, 11 de novembro, e, depois de 25 anos de espera, finalmente pude presenciar uma apresentação ao vivo do R.E.M.

Aquela tarde/noite foi marcada por várias situações inusitadas: a espera de horas para ficar em um bom lugar; o fim da cerveja no meio do show; a loira desconhecida que dançava como se não houvesse amanhã, enquanto sussurrava em meu ouvido. Foram algumas das situações para as quais estava desacostumado. Mas a noite estava apenas começando.

Na saída do estádio do Zequinha inúmeros ambulantes vendiam cervejas, refrigerantes, águas minerais. Sedento, parei em uma e comprei uma daquelas latas de 500ml. Continuei o caminho, a procura de um táxi que me levasse até o Centro de Porto Alegre para a parte derradeira da aventura: a volta em ônibus pinga-pinga até minha tao mal falada e violenta terrinha. No meu trajeto, entretanto, tudo mudou.

Aos gritos 'skol um litro a cinco reais', um grupo chamou minha atenção. Eram dois casais que exibiam o mais perfeito estereótipo do estudante de História/Filosofia/Sociologia da UFRGS. Decidi arriscar, afinal, o assunto me interessava: cerveja. Parei ao lado deles e puxei papo quanto a venda da cerveja. Descobri que eles vendiam trufas, também. E que moram em Canoas.

Os casais não eram exatamente casais. Um de verdade: Rodrigo – ou Capitão, como também era chamado – exibia sua barba de, pelo menos dois meses, como um troféu. Junto dele, sua namorada, uma morena cujo nome não lembro. Cara de criança, sorriso inocente, mas com olhos que despontavam malícia e experiência. O outro par era formado por uma loira hippie que falava pelos cotovelos as coisas mais absurdas e geniais do mundo – e estava com a perna quebrada; e um rapaz que destoava do grupo e pouco se manifestou.

Enquanto terminava minha lata para começar a próxima rodada, conversávamos amenidades: sobre o show, sobre o fato de eles realmente serem estudantes da UFRGS – de História, no caso. Papo vai, papo vem, a cerveja acaba. Tento comprar uma deles, mas se negam a vender. Serei obrigado a tomar com eles, de graça. Certamente não fiquei decepcionado.

Falávamos sobre o show deu inveja de saber que ali, fora do estádio, economizando 80 reais, era possível assistir de um telão, bebendo muita cerveja. Inveja momentânea, claro. Foram os 80 reais mais bem investidos da minha vida.

Certa altura, a morena – figura pequena e graciosa, com lábios bem feitos e pernas invejáveis, cujo nome não me recordo mais – saca um livro da sua bolsa hippie. De canto de olho leio o título: Mulheres. Segue-se o diálogo:
- É Bukowski?
- Não, ainda é cedo para Bukowski. É Galeano.
- Que massa, não conhecia esse livro.
- É uma coletânea de textos em homenagem às mulheres.

Nesta hora, Rodrigo se aproxima:
- Podemos ler uma coisa para ti?
- Claro, seria ótimo.

A menina começa, voz doce, suave e sexual:

Maria Padilha
Ela é Exu e também uma de suas mulheres, espelho e amante: Maria Padilha, a mais puta das diabas com quem Exu gosta de revirar nas fogueiras.

Não é difícil reconhecê-la quando entra em algum corpo. Maria Padilha geme, uiva, insulta e ri com muito maus modos, e no fim do transe exige bebidas caras e cigarros importados. É preciso dar a ela tratamento de grande senhora e rogar-lhe muito para que se digne exercer sua reconhecida influência junto aos deuses e diabos que mandam mais.

Maria Padilha não entra em qualquer corpo. Ela escolhe, para manifestar-se neste mundo, as mulheres que nos subúrbios do Rio ganham a vida entregando-se a troco de tostões. Assim, as desprezadas se tornam dignas de devoção: a carne de aluguel sobe ao centro do altar. Brilha mais que todos os sóis o lixo da noite.



Fiquei sem palavras para descrever os sentimentos que me passavam pela cabeça e acabamos mudando de assunto e voltando à cerveja de litro até a hora de ir embora.

Trocamos telefones e nos despedimos como bons bebuns: marcando encontros para datas próximas.

Mas eu sabia que aquela era a primeira e a última vez que os viria. Porque às vezes, só às vezes, esta é a melhor forma de conhecer pessoas.

sábado, 4 de julho de 2009

"Tenías un vestido y un amor...

Y yo simplemente te vi."

Lembranças

Lembranças são pensamentos cruéis. Insistem em surgir nos momentos mais inconvenientes, trazendo com elas, as sensações menos confortáveis e mais nostálgicas possíveis. Mesmo assim, nos apegamos a elas como se fossem sopros de vida e luz. Só mais uma artimanha malígna das lembranças!

João Cabral de Melo Neto me traz um desses momentos. Por ele, conheci Cordel do Fogo Encantado e, por algum tempo me apaixonei. Paixão que se expandiu para muitas áreas, me fez rumar ao mais longínquo destino até hoje e me deu muitas coisas que hoje me são caras. Mas foi um fogo tão ardente quanto efêmero, que rápido se transformou em brasa. Mas que deixou muitas e muitas LEMBRANÇAS! Ah, as lembranças!

Dos três Mal-amados
Joaquim:

O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.

O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas. O amor comeu metros e metros de gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus. O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos.

O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minhas dietas. Comeu minhas aspirinas, minhas ondas-curtas, meus raios-X. Comeu meus testes mentais, meus exames de urina.

O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações em verso. Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos.

Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina.

O amor comeu as frutas postas sobre a mesa. Bebeu a água dos copos e das quartinhas. Comeu o pão de propósito escondido. Bebeu as lágrimas dos olhos que, ninguém o sabia, estavam cheios de água.

O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome.

O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas. O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel.

O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso.

O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala.

O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.

Versão reduzida, declamada por Lirinha:

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Pablo Neruda

Quero apenas cinco coisas..
Primeiro é o amor sem fim
A segunda é ver o outono
A terceira é o grave inverno
Em quarto lugar o verão
A quinta coisa são teus olhos
Não quero dormir sem teus olhos.
Não quero ser... sem que me olhes.
Abro mão da primavera para que continues me olhando.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Gay Talese

Embora não tão importante quanto Hunter S. Thompson na minha opção pelo jornalismo, Gay Talese foi uma das figuras que realmente influenciaram a decisão de seguir esta carreira (que, aos 26 anos, ainda nem começou).


Agora, Talese ganha um pouco mais de importância - juntamente com Thompson e outros nomes do Gonzo e New Journalism: será parte do meu trabalho de conclusão de curso, que começo a elaborar, oficialmente, hoje.

Me frustra, entretanto, saber que o cara acabou de chegar no Brasil para a Festa Literária Internacional de Paraty para falar, neste sábado, sobre "Fama e Anomimato". E eu NÃO PODEREI assistir.

Tenho desejo de participar de um Flip desde a primeira edição. Mas. questões financeiras e relativas a compromissos de trabalho (e aula) sempre impediram.

Infelizmente ainda não será neste ano.

Um adendo
Na verdade, lembrei do Flip porque encontrei casualmente uma matéria no site do Estadão falando sobre a chegada do Talese. Gostei da opinião dele quando perguntado sobre o fim da obrigatoriedade do jornalismo. A resposta veio precisa e coerente, como é de se esperar de um bom contador de histórias:

Eu não acho que escolas de jornalismo sejam necessariamente o melhor lugar para aprender jornalismo. Mas, por outro lado, boas escolas de jornalismo ensinam princípios que costumam ser ignorados com frequência. Como, por exemplo, equidade, precisão, objetividade e completude. E como pesquisar profundamente um assunto.

Uma diferença entre os jovens jornalistas de hoje e os colegas de minha geração é que nós fazíamos mais pesquisa, investíamos mais tempo, andávamos mais e não confiávamos muito no telefone. E, não se esqueça, o telefone era a tecnologia do momento quando eu era jovem, seguido mais tarde pelo gravador de fita. Eu nunca uso gravadores de fita. E não fazia entrevistas pelo telefone, pois queria ver, olho no olho, a pessoa com quem eu estava conversando. Eu queria estudar sua linguagem corporal e absorver a atmosfera do lugar onde a entrevista ocorria.

Pelas ruas

Carlos Chagas, Júlio de Castilhos, Chaves Barcelos, Voluntários da Pátria, Senhor dos Passos, Salgado Filho, João Pessoa, da República, Baronesa do Gravataí! Estas poucas ruas tem me trazido os momentos mais alegres deste início (agora meio, já) de semana.
O caminho da felicidadade é MAIS OU MENOS assim:
P.s.: o caminho é mais ou menos assim porque o Google Maps ainda não consegue prever que uma pessoa pode atravessar a rua em QUASE TODOS os lugares sem precisar fazer retornos absurdos. Mas, dá para ter uma idéia.
:D